
2 de julho de 1944. O primeiro escalão da Força Expedicionária Brasileira embarca para a Itália. É o início da jornada de milhares de brasileiros que combateriam durante sete meses e dezenove dias no país europeu. Essa história, que completa 70 anos em 2014, começou a ser moldada quase um ano antes, quando o Ministro de Estado da Guerra General Eurico Gaspar Dutra expediu o documento que viabilizava a criação da FEB. O ato oficial orientou os comandos das regiões militares e demais órgãos do exército brasileiro a preparar o contingente de soldados que lutaria contra as forças do Eixo, durante a Segunda Guerra Mundial. História em grande parte escrita por pessoas comuns como Armando Pernanchini, Antônio Honório de Lima, Mário Damico, João Mineto e José Jack Dias Pires. História que permanece viva nas lembranças desses homens de guerra.


O destino vos escolheu para a missão histórica de fazer tremular, nos campos de luta, o pavilhão auriverde e responder com a presença do Brasil às ofensas e humilhações que nos tentam impor.
Dedicai-vos de corpo e alma à vossa gloriosa missão
(Presidente Getúlio Vargas, em discurso a oficiais e soldados brasileiros antes da partida do 1º escalão da FEB para a guerra)
A COBRA FUMOU
Os caminhos da guerra
Da política aos campos de batalha
25.334 brasileiros. Esse foi o número de homens enviados pelo Governo de Getúlio Vargas ao "teatro de operações" - local em que se travam as batalhas - durante a Segunda Guerra Mundial. Organizados em cinco escalões que partiram do Rio de Janeiro entre julho de 1944 e fevereiro de 1945, eles foram protagonistas de um feito histórico que alçou o Brasil à posição de primeiro país sul-americano a fparticipar de uma guerra em território europeu.
O ingresso no conflito mundial foi precedido de acontecimentos que viriam a romper a neutralidade mantida pelo Brasil desde o início do confronto travado entre Aliados (liderados pela União Soviética, os Estados Unidos e o Império Britânico) e as forças do Eixo (Alemanha, Itália e Japão). O país ocupava papel estratégico dentro dos planos americanos, em decorrência de suas peculiaridades físico-geográficas e da influência que poderia exercer sobre seus vizinhos. O Governo brasileiro era alvo dos Estados Unidos, que exercia, desde 1939, seguidas pressões diplomáticas reivindicando a liberação do uso de portos e aeroportos do Nordeste brasileiro, considerados estratégicos para a defesa do Atlântico Sul e também para as operações de combate aos exércitos alemães que ocupavam o norte da África. O General Marshall, chefe do Estado-Maior dos Estados Unidos, chegou a visitar o país, em junho daquele ano, com o intuito de estreitar as relações entre as duas nações.
A estratégia do presidente americano Franklin Delano Roosevelt para superar a resistência isolacionista da região latino-americana foi colocar em prática uma aproximação baseada na política da "boa vizinhança" nas áreas econômica e de defesa militar. O presidente Getúlio Vargas considerou aquela situação como a chance de obter dos Estados Unidos recursos para o reaparelhamento das Forças Armadas brasileiras e também tecnologia e financiamento para a construção de uma grande usina siderúrgica nacional. O ataque japonês à base de Pearl Harbor, em dezembro de 1941, por sua vez, reforçou o jogo de interesses, com o governo Roosevelt condicionando a colaboração técnica e econômica almejada pelo Brasil ao seu envolvimento direto no conflito.
Getúlio Vargas manteve a neutralidade até meados de 1942, quando navios mercantes brasileiros foram torpedeados por submarinos alemães, provocando a morte de centenas de pessoas. O acontecimento desencadeou manifestações lideradas pela União Nacional dos Estudantes (UNE) e pela Liga de Defesa Nacional. A pressão externa, a comoção nacional e o próprio receio do Governo Vargas ante uma possível insurreição da "quinta-coluna" no país (célula do Partido Nacional-Socialista Alemão que atuava em países em guerra, ou em vias de entrar na guerra, preparando ajuda em caso de invasão ou fazendo espionagem e propaganda em favor do Eixo) levaram o presidente a romper relações diplomáticas com Alemanha e Itália, no dia 22 de agosto, e declarar estado de guerra através do Decreto nº 10.358, publicado nove dias depois. Atitude que se chocaria com a própria ideologia de seu governo.
A ruptura abriu espaço para a instalação, no Rio Grande do Norte, da base aérea de Parnamirim, considerada na época um símbolo da defesa do Hemisfério Ocidental e a maior base militar norte-americana fora do território dos Estados Unidos. Também foram instaladas bases navais em vários pontos do litoral brasileiro, destacando-se a capital pernambucana de Recife como centro do Comando do Atlântico Sul. No entanto, após as baixas do Marechal Rommel, comandante do destacamento alemão AfrikaKorps na África do Norte, onde auxiliava as forças italianas a enfrentar o exército britânico, os interesses americanos sobre as bases nordestinas diminuíram bastante. Assim, surgia o plano de mobilizar um contingente brasileiro para lutar nos campos de batalha europeus, ao lado dos norte-americanos.
A ideia de criar uma força militar brasileira para participar do conflito começou a ser moldada no início de 1943. Em março deste mesmo ano, o presidente brasileiro aprovou proposta do Ministro de Estado da Guerra, General Eurico Gaspar Dutra, para criar uma força expedicionária, mas com a condição de que o país fosse abastecido pelos Estados Unidos de todo material bélico necessário. A Portaria Ministerial nº 47-44, publicada no dia 9 de agosto de 1943, aprovou instruções aos comandantes das 1ª, 2ª, 4ª e 9ª Regiões Militares e às Diretorias das Armas, de Material Bélico, de Saúde, de Engenharia, de Moto-Mecanização e de Intendência para a criação da Força Expedicionária Brasileira (FEB). Seu comando foi entregue ao General João Batista Mascarenhas de Moraes.
A decisão de criar a FEB demandou sua rápida estruturação. Oficiais brasileiros foram enviados aos Estados Unidos com o intuito de conhecer métodos e táticas militares empregados pelas tropas norte-americanas. O breve treinamento dado aos pracinhas antes do embarque substituiu a formação francesa, usada pelo exército brasileiro desde a Primeira Guerra Mundial. No final de 1943 decidiu-se o destino das tropas brasileiras: a Itália. No dia 30 de junho do ano seguinte, o 1º escalão da FEB embarcou com destino às terras italianas. Até fevereiro de 1945, mais quatro contingentes, transportados em navios norte-americanos, fariam esse mesmo trajeto.
Incorporados à 5ª Companhia do Exército Americano (integrante do décimo Grupo de Exércitos Aliados), os pracinhas receberam a missão de impedir o deslocamento alemão para a França, onde se preparava a ofensiva final das forças aliadas. Era preciso manter constante pressão sobre as tropas nazi-fascistas. E foi isso que os brasileiros fizeram, mesmo enfrentando um inverno rigoroso, as dificuldades de um ambiente hostil e, muitas vezes, a falta de preparo militar. Converteram-se em protagonistas de batalhas históricas em localidades como Massarosa, Camaiore, Monte Prano, Castelnuovo, Montese e Monte Castelo, contrariando a descrença de seus próprios conterrâneos, que insistiam em afirmar que era mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil entrar na guerra.
Embarque da FEB no Rio de Janeiro
A cobra fumouCasa em Montese atingida pela Artilharia da FEB
A cobra fumou
Crédito: Arquivo Histórico do Exército Brasileiro
Como a FEB vivia na Itália
As instruções do Ministro de Estado da Guerra General Eurico Gaspar Dutra para a organização da Força Expedicionária Brasileira determinaram que a FEB fosse constituída pela 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (DIE) e algumas unidades não divisionárias.
Seguindo os moldes táticos adotados pelo Exército dos Estados Unidos, que foi responsável pelo treinamento de oficiais e soldados brasileiros antes e depois da chegada à Itália.
A DIE teria sua força de combate dividida em três Regimentos de Infantaria (RI): o 1º RI (Regimento Sampaio, sediado no Rio de Janeiro - RJ), o 6º RI (Regimento Ipiranga, oriundo de Caçapava-SP) e o 11º RI (Regimento Tiradentes, procedente de São João Del Rei - MG). Completavam sua estrutura um Esquadrão de Reconhecimento Mecanizado, quatro Grupos de Artilharia de Campanha (a Artilharia Divisionária), um Batalhão de Engenharia, um Batalhão de Saúde, as Companhias de Transmissões (Comunicações), de Manutenção, de Intendência e de Polícia, além de pequenas unidades de serviço, como uma agência do Banco do Brasil e os componentes do Pelotão de Sepultamento.
A Artilharia Divisionária, equipada pelos norte-americanos ao chegar na Itália, era formada por quatro Grupos de Obuses (espécie de canhão). Cada um deles era dividido em três baterias, de quatro canhões. A Artilharia tinha como auxiliar o Esquadrão de Ligação e Observação, que usava aviões pequenos e frágeis para monitorar, por via aérea, os alvos a serem atingidos por ela.
"Sem farinha, arroz e feijão a gente come, mas não almoça nem janta!". Com essas palavras, Rubem Braga – jornalista correspondente do Diário Carioca na guerra – descreve a reação geral que a alimentação norte-americana provocou entre os soldados brasileiros.
As rações foram pensadas e desenvolvidas pelo Dr. Ancel Keys, fisiologista da Universidade de Minnesota, a pedido do Departamento de Guerra dos EUA, responsável por fornecer a comida aos brasileiros e americanos. Na retaguarda, havia cozinha para preparo de alimentos das tropas. Mas os militares que estavam na frente de batalha não podiam voltar a qualquer momento, então levavam as rações de guerra. O historiador e bacharel em gastronomia pela Universidade Federal da Bahia, Luciano Meron, estudou os três tipos de rações:
Rações K: eram pequenas caixas de papelão impermeabilizadas que acondicionavam uma refeição, podendo ser breakfast (matinal), lunch (almoço) e dinner (jantar). Normalmente, havia uma lata com uma mistura de ovos ou verduras, um doce de fruta, uma bebida em pó (chocolate, café ou limonada), torrões de açúcar, dois biscoitos, chicletes e cigarros;
Rações C: pequenas latas fornecidas sempre aos pares, conhecidas pelos veteranos como a "pesada" e a "leve". Possuía três variações: feijão branco com carne, carne com batatas amassadas e carne com verduras. A outra lata era recheada com bolachas, balas ou chicletes, uma bebida em pó (como na ração K), açúcar e, eventualmente, cigarros ou papel higiênico;
Rações B: produzidas em cozinhas de campanha, continham muitos alimentos pré-preparados. Entre os ingredientes estavam carnes congeladas de aves, porco e boi; verduras e legumes desidratados; pães, geleias, manteiga e doces de frutas em calda; ovos, leite em pó e sucos.

Na foto, pracinhas brasileiros almoçam sobre jipe. Mas nem sempre podiam parar para as refeições, por isso carregavam as "rações de guerra".
Crédito: O Resgate da FEB

Cada soldado possuía um kit com uma marmita de alumínio como esta, utilizada pelo pracinha João Mineto.
Crédito: Acervo pessoal João Mineto
A FEB enfrentou uma série de dificuldades logísticas ao chegar na Itália. Uma delas referia-se às vestimentas dos expedicionários. Nem mesmo a visita de uma comissão de oficiais brasileiros aos campos de batalha antes do embarque dos primeiros pracinhas, com o intuito de conhecer as condições do ambiente de guerra, ou o Plano de Uniformes expedido pelo Governo de Getúlio Vargas, em 20 de março de 1944, foram suficientes para prevenir a situação.
Enquanto o documento oficial assinalava que "as exigências gerais da guerra extracontinental e as condições de clima e terreno, em particular, determinavam modificações nas peças de fardamento" usadas pelo Exército brasileiro, relatos como o do General Mascarenhas de Moraes, em seu livro de memórias, evidenciam que elas não foram suficientes para enfrentar a dura realidade das gélidas montanhas italianas. Segundo o General, os uniformes, calçados e agasalhos dos pracinhas brasileiros eram inapropriados ao clima frio da região norte da Itália. E coube aos órgãos logísticos americanos incumbir-se do papel de oferecer todo material que faltava às tropas brasileiras.
Os uniformes da FEB tinham cores distintas, como o verde oliva e o "reed green". Este último, por ser semelhante ao fardamento usado pelos alemães, levou muitos moradores locais a confundirem os primeiros pracinhas a desembarcarem em solo italiano com aqueles que chamavam de "tedescos" (referência aos inimigos alemães).
Também era característica dos uniformes da FEB a insígnia da cobra fumando bordada em sua manga. O capacete de fibra coberto por outro de aço completava o traje dos soldados.
Após partir do Brasil portando apenas os apetrechos básicos que seriam utilizados no dia a dia dos campos de batalha, os escalões brasileiros foram equipados pelos norte-americanos com armas que seriam empunhadas durante o conflito contra as tropas nazi-fascistas. A 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (DIE) reproduzia fielmente o modelo de organização americano e operava com 66 obuses e 144 morteiros, 1.156 pistolas calibre 45, 500 metralhadoras, 2.287 armas anticarro (13 canhões, 585 bazucas e 1.632 lança-granadas), 11.831 fuzis e 1.410 viaturas motorizadas. Com isso, a divisão tinha condições de atacar numa frente de batalha de até 6 quilômetros.
Carabina M-1
ArmamentosFuzil Garand
ArmamentosFuzil Metralhador Browning - B.A.R.
ArmamentosFuzil Springfield
ArmamentosMetralhadora Bronwning M2
ArmamentosGranada MK 2
ArmamentosObus de 155mm M1
ArmamentosPistola Colt 45ACP
ArmamentosSmith Wesson 45 1917
ArmamentosSubmetralhadora M-3 “Grease-Gun”
ArmamentosSubmetralhadora Thompson M1A1-45-ACP
Armamentos
A região de Bauru em tempos de guerra
No Brasil, a população acompanhava os desdobramentos do conflito, por meio das notícias publicadas em jornais e programas radiofônicos da época. Alguns veículos chegaram a enviar correspondentes ao front. Se as notícias eram fonte de angústia em muitos momentos, também serviram de alento quando veio o comunicado do fim da guerra.
No dia 8 de maio de 1945, os sinos das igrejas tocavam sem cessar e uma multidão tomava as ruas centrais das cidades. Esse era o cenário na região de Bauru enquanto a famosa frase "o Füher morreu! Terminou a guerra! Terminou a guerra! Terminou a guerra!" ecoava na voz de Heron Domingues, o Repórter Esso da Rádio Nacional. E havia muito motivo para tamanha felicidade e comemoração no chamado "Dia da Vitória". Principalmente para os familiares dos brasileiros que combatiam em campos europeus.

A igreja Santa Teresinha recebeu missa em comemoração pelo término da guerra. A população da região lotou a paróquia localizada no Centro de Bauru.
Crédito: Arquivo pessoal Luciano Dias Pires
O jornalista e historiador Luciano Dias Pires era adolescente na época e lembra com detalhes as dificuldades que a maior guerra da história trouxe para os habitantes da região. Ele recorda o racionamento de carnes e pães em função do rompimento de relações diplomáticas do Brasil com os países do Eixo, o que impediu a importação de produtos como o trigo. A solução do governo foi criar o que ficou conhecido como "pão de guerra", que substituía o ingrediente por farinha de milho.
O historiador lembra que os bauruenses, além de terem que esperar em grandes filas para conseguir o pãozinho, deviam respeitar o número limite de unidades que cada pessoa poderia comprar. A medida foi uma tentativa de evitar que muitas famílias ficassem sem o alimento.
Outro item que sofreu grande racionamento foi a gasolina. A crise do petróleo obrigou os motoristas da região a adaptarem seus veículos para utilizarem gasogênio, gás obtido por meio da queima de carvão. Isso exigiu que instalassem grandes latões nas traseiras dos carros para comportar o combustível.
Quatro mortos em combate
Segundo a 6ª Circunscrição de Serviço Militar (unidade que coordena o Serviço Militar na região), o número de pracinhas que partiram de Bauru e região é incerto. A estimativa é de que, apenas de Bauru, trinta e oito foram defender a FEB.
Entre os bauruenses, houve duas mortes: o soldado Rodrigo Leme da Silva (do 1º Regimento de Infantaria), que morreu em 24 de novembro de 1944 na cidade de Palazzo, e o cabo Antônio Alves Belmont (do 6º Regimento de Infantaria), que sofreu um acidente na cidade de Crossiano em 24 de março de 1945.
Outro que faleceu em combate foi o 2º Sargento Andirás Nogueira de Abreu, natural de Agudos, em 29 de abril de 1945. Seu corpo foi encontrado em Collechio. Dos brasileiros que partiram de Botucatu, o soldado Almiro Bernardo (do 11º Regimento de Infantaria) faleceu em 12 de dezembro de 1944, em Monte Castelo. Ele participou de uma patrulha próxima ao Monte, na qual todos morreram atingidos pelo bombardeio alemão. Seu corpo, junto com os demais, só foi encontrado após a conquista de Monte Castelo. Alguns dos corpos estavam em posição de combate, o que leva a crer que lutaram até o último tiro. Eles ficaram conhecidos como "os 17 de Abetaia", referência ao número de mortos e à região onde foram encontrados
Famílias dos pracinhas recebiam auxílio de entidade
A ligação entre os pracinhas brasileiros e seus parentes e amigos recebia apoio da Legião Brasileira de Assistência às Famílias dos Pracinhas (LBA). A entidade criada por Darcy Vargas, esposa do então presidente Getúlio Vargas, possuía sedes em algumas cidades brasileiras, incluindo uma unidade na praça Rui Barbosa, ao lado do Automóvel Clube, em Bauru.
Segundo Luciano Dias Pires, a LBA intermediava principalmente o envio de cartas, roupas, doces e cigarros para a Itália e também recebia as correspondências dos pracinhas para os familiares. O historiador lembra que muitas cartas foram rasuradas pelo Exército para evitar que, em caso de extravio, inimigos pudessem ter detalhes da localização dos brasileiros.
Outra responsabilidade da LBA, que em Bauru era coordenada pela poetisa Semiramis Mourão de Almeida, foi a Sociedade Creche Berçário Rodrigues de Abreu, cujo atendimento se voltava aos filhos dos combatentes. Após a guerra, a LBA encerrou suas atividades, mas a creche continua a existir até hoje, atendendo crianças bauruenses. Atualmente, existem duas sedes, sendo uma no Centro de Bauru e outra no Jardim Redentor.
Bauru era local de treinamento da FAB
Durante a Segunda Guerra Mundial, Bauru teve importância estratégica para a Força Aérea Brasileira (FAB). Em função do céu claro e limpo, a cidade foi escolhida como ponto de treinamento da FAB. Bauru recebia as atividades no período noturno. Com os aviões sobrevoando em baixa altura, os habitantes da região tinham a sensação de viverem a guerra.
Na época, duas unidades da FAB foram enviadas para a Itália: o 1º Grupo de Aviação de Caça, o Senta a Pua!, e a Primeira Esquadrilha de Ligação e Observação (1ª ELO). Na composição da equipe, havia um bauruense que, aliás, prestou significativa contribuição para a FAB.
Aviador bauruense foi condecorado pelos Estados Unidos
Formado pelo Aeroclube de Bauru, o segundo-tenente-aviador Arnaldo Vissoto combateu na Itália pela Força Aérea Brasileira (FAB), como parte da 1ª Esquadrilha de Ligação e Observação (1ª ELO). A função do bauruense era sobrevoar e fotografar as tropas inimigas, com o objetivo de registrar suas movimentações.
O aviador realizou 64 missões, segundo a Força Aérea Brasileira, e foi condecorado na cidade de Alexandria por sua bravura e sucesso na batalha. Assim que chegou a Bauru, em 1945, Vissoto foi recebido com muita festa. Uma multidão aguardava o bauruense em frente à estação ferroviária. Após a chegada, ele desfilou pela rua Batista de Carvalho e discursou no coreto da praça Rui Barbosa, ao lado de personalidades da cidade, como o professor Guedes de Azevedo.

O aviador Arnaldo Vissoto cumpriu 64 missões na Itália. Ele foi condecorado pela United States Air Force (Força Aérea dos Estados Unidos) pela bravura na batalha.

No final do desfile, Arnaldo Vissoto contou suas experiências na guerra em discurso realizado no coreto da Praça Rui Barbosa. Ele estava acompanhado de autoridades da região, como o professor Guedes de Azevedo.
Crédito: Arquivo pessoal Luciano Dias Pires


Pracinhas
O perfil dos guerreiros brasileiros
Vindos de diferentes partes do Brasil, eles tinham em média 20 anos de idade quando se viram diante da perspectiva de ingressar numa guerra distante. Em solo inimigo, os pracinhas - como eram carinhosamente chamados em referência ao termo "praça" (soldados, cabos, sargentos e subtenentes) do Exército - viveram experiências que mudariam suas vidas para sempre. Cinco desses homens, nascidos e criados na região de Bauru, têm suas histórias registradas aqui. Histórias que eles e suas famílias lutam para manter vivas dia após dia.

ARMANDO PERNANCHINI
Momentos de tensão e surpresa marcam a história de Armando Pernanchini na Segunda Guerra Mundial
"A guerra é isso… a gente mata para não morrer."
A conclusão de Armando Pernanchini evidencia a angústia que viveu enquanto foi membro da 1ª Companhia de Petrechos Pesados (CPP I), que pertencia ao 6º Regimento de Infantaria da FEB. Ainda criança, ele já havia vivido drama semelhante, quando seu pai foi assassinado e deixou para a esposa a tarefa de criar oito filhos pequenos.
Na época, o cabo Armando estava com apenas sete anos e logo teve que aprender a manejar martelos e furadeiras para exercer a marcenaria. Anos mais tarde, os equipamentos de trabalho mudaram quando ele passou a vestir a farda do Exército brasileiro. Os 280 cruzeiros mensais que ganhava como militar tinham um destino: ajudar a mãe com as despesas de casa.
Para o pracinha, a notícia de que participaria da Segunda Guerra Mundial não foi surpresa. Acompanhado dos 5 mil soldados do 1º Escalão da Força Expedicionária Brasileira, ele embarcou no navio estadunidense General Man em 2 de julho de 1944. Até então, os soldados não sabiam o destino. Ele revela que essa era uma tática para despistar um eventual torpedeamento por parte dos alemães. Na chegada à Itália, encontrou um local destruído pela sangrenta batalha. Ruas desertas, vidros quebrados, navios afundados no porto eram a realidade de Nápoles.
No Velho Continente, os soldados brasileiros receberam ordens e instruções do comando militar dos Estados Unidos, que buscava adaptar os jovens e inexperientes soldados à dura realidade da guerra. A região de combate era montanhosa e o exército alemão dominava os locais mais altos, de onde podiam ver os movimentos dos pracinhas tentando se aproximar de suas posições. Armando lembra os cuidados e a cautela que precisavam manter para não serem atingidos pelos inimigos.

Crédito: Arquivo pessoal Armando Pernanchini
Ainda assim, a guerra trouxe muitas surpresas, como quando conseguiram prender 15 mil alemães de uma só vez. Apesar de se lembrar com orgulho dos momentos de bravura dos brasileiros, Armando Pernanchini também relata episódios de grande apreensão durante o conflito. Exemplo disso foi a surpresa que teve quando percebeu que dormia próximo ao corpo de um inimigo morto.
Para Armando, o que ajudava a superar a pressão do campo de batalha eram as cartas com notícias da família, sempre reforçando a esperança de sua volta. O regresso ao Brasil, aliás, é um dos momentos mais vivos na memória do pracinha. Assim que pisou no Rio de Janeiro, pediu a um amigo que avisasse sua família que ele estava vivo. O soldado diz que chegou a anunciar sua chegada no microfone da Rádio Nacional.
Após o conflito, Armando recebeu condecorações pelo mérito de participar da maior guerra de todos os tempos. Mas ele não aposentou a farda. Com a fundação da Polícia Rodoviária pelo governador Ademar de Barros, em 1948, continuou sua história.

Crédito: segundaguerra.net
Galeria de Armando Pernanchini
Crédito: Arquivo pessoal Armando Pernanchini

ANTÔNIO HONÓRIO DE LIMA
Militar de corpo e alma, a honra de defender a pátria evitou que agudense fugisse do Exército
"Seja o que Deus quiser. Se é pra viver ou morrer, vamos lá."
Para Antônio Honório de Lima (ou Cabo Lima, como prefere ser chamado), o medo não era desculpa para desistir de embarcar para a Europa e lutar contra o nazi-fascismo. Na memória do veterano agudense de 90 anos, as histórias vividas nas montanhas italianas durante a Segunda Guerra Mundial ainda estão bem vivas.
Quase setenta anos depois do conflito, a disciplina de um legítimo militar ainda está presente em seu cotidiano. Para ele, a aposentadoria da farda não justificaria o abandono da postura de soldado. Por isso, até hoje faz questão de vestir seu terno e decorá-lo com as medalhas que simbolizam sua bravura. "Ele é assim. Meu marido também era militar, e meu pai sempre fez questão de bater continência para ele", lembra uma das filhas.
Antes de partir para a Itália com a 1ª Cia do Regimento Sampaio da FEB e de participar de batalhas como Castel D'aiano, Montese, Belvedere, Piacenza, Porretta Terme e Monte Castelo, Cabo Lima serviu o Exército Brasileiro em Campo Grande (MS) e Caçapava (SP). Quando recebeu a notícia de que a cobra iria mesmo fumar, um amigo militar tentou convencê-lo a desertar. O amigo fugiu, mas Cabo Lima decidiu lutar pelo seu país, mesmo com a família preocupada com seu destino na guerra.
No território italiano, o agudense participou de batalhas difíceis e decisivas, como a tomada da região de Monte Castelo, a maior vitória da FEB. O lugar era ponto estratégico para a ofensiva dos alemães, e sua conquista exigiu grande esforço dos pracinhas.
Para piorar a situação dos jovens soldados durante as batalhas, havia ainda o intenso frio e a escassez de alimentos, que eles tentavam enfrentar com o peculiar "jeitinho" brasileiro. Cabo Lima lembra que eles procuravam comida em casas abandonadas pelos italianos. Em uma ocasião, conseguiram descobrir um lugar que estocava queijo e barris de vinho. O pracinha se diverte ao lembrar que alguns soldados saíram bêbados do local encontrado.
Outro motivo de diversão para o expedicionário é a lembrança do respeito que os alemães tinham pelos brasileiros. Segundo o pracinha, os americanos e ingleses que lutavam na Itália
eram medrosos, enquanto os brasileiros se arriscavam mais durante as batalhas. Por isso, eles causavam receio aos "tedescos", como os italianos chamavam os germanos. Entre os motivos de tamanha coragem dos pracinhas estava a saudade da família. Lima não esquece a emoção que sentia ao receber cartas, até mesmo quando elas vinham censuradas. A emoção só não foi maior daquela sentida no momento da volta ao seu país. Segundo ele, em meio às comemorações ao avistarem o Rio de Janeiro, os pracinhas quase viraram o navio que os trazia de volta.

Galeria de Antônio Honório de Lima
Crédito: Acervo pessoal Antônio Honório de Lima

MARIO DAMICO
Macatubense lembra do temor daqueles que iam para o front
"Coisa medonha"
Assim Mario Damico descreve a maior parte de suas experiências na Força Expedicionária Brasileira, como um dos milhares de brasileiros que atravessaram o Oceano Atlântico rumo aos combates na Itália. Passados quase setenta anos desde o fatídico dia em que desembarcou no porto de Nápoles, ele ainda parece não acreditar em tudo que viveu.
Se o tempo e a idade já o impedem de lembrar todas as datas e nomes de lugares por onde passou, o pracinha faz questão de compartilhar momentos inesquecíveis de sua história. Lembranças de um jovem de 22 anos, nascido em um sítio no distrito de Bocaiuva (atual município paulista de Macatuba), que deixou a família e os amigos quando foi lutar em solo italiano. História de um homem que sobreviveu às insanidades do conflito mais cruel e destrutivo de todos os tempos, e mesmo assim, aos 91 anos de idade, consegue relatar tais episódios com o bom humor que transforma suas lembranças em verdadeiros tesouros.
Na sala da casa do expedicionário é possível perceber a importância que os sete meses na Itália tiveram em sua vida. Na parede, como objetos de decoração, o Certificado de Reservista, o Diploma da Medalha de Campanha e um quadro com a cobra fumando, símbolo exibido pelos febianos com orgulho, ocupam lugar de destaque. Assim como o porta-retrato onde um jovem Mario Damico posa para uma foto oficial vestindo sua impecável farda, um mês antes de ser convocado para integrar o contingente brasileiro que se uniria à 5ª Companhia do Exército Americano na Itália. Prenúncio de dias que marcariam sua vida para sempre.
O caminho entre Campo Grande (Mato Grosso), onde Mario servia o exército, e a Vila Militar de Deodoro, no Rio de Janeiro, que abrigava brasileiros de diferentes partes do país antes de embarcar nos navios americanos que faziam a travessia dos combatentes, foi o início de uma viagem repleta de incertezas e medo. Em alto mar, contando apenas com a vigilância de um "blimp" (zeppelin) da Marinha dos EUA para proteger as embarcações militares contra possíveis ataques inimigos, o pracinha diz lembrar das ondas gigantes e a correria pelas escadarias do navio quando alguma ameaça parecia se aproximar. "Coisa medonha", como gosta de reforçar.
Apesar de não ter ido para o front, como muitos de seus companheiros, o macatubense esteve imerso na ansiedade e na apreensão daqueles que esperavam no Depósito de Pessoal da FEB, até que sua hora chegasse. E ela quase chegou duas vezes. Mas "por sorte", como garante o pracinha, nunca precisou embarcar nos caminhões americanos que levavam os soldados do acampamento brasileiro, na região de Florença, até a linha de frente do conflito.
A espera, os companheiros perdidos, o frio desconcertante, os dias de treinamento e a saudade da família só viriam completar a rotina do pracinha na zona de guerra. Experiência pela qual passou ileso, mas ainda o faz se emocionar toda vez que fala do retorno para casa; o reencontro com aqueles que não tinha certeza se um dia veria novamente.

Galeria de Mario Damico

JOÃO MINETO
Em nome do pai
Filho de um italiano, João Mineto foi levado pela primeira vez à terra de seu pai quando tinha 22 anos de idade. Não foi lá para reencontrar suas raízes ou remontar suas origens. Ele foi para a guerra. Soldado do Regimento Sampaio, encarregado do conserto de linhas telefônicas entre o front e o comando da FEB, o pracinha, natural de Macatuba (São Paulo), foi testemunha dos horrores da guerra. Bombardeios. Rajadas de tiro. Explosões. Mortes. Todos temas comuns nas poucas histórias que compartilhava com a família depois que voltou para o Brasil. Histórias que seu filho Manuel mantém vivas.
Nas raras vezes que falava de seus dias de guerra, ele lembra do pai contar sobre o desembarque em terras italianas, que, na verdade, ocorria em alto mar. A chegada ao continente só era possível após o transbordo em barcas abarrotadas de soldados, todos chocados pelo fato de estarem em um país diferente e hostil, onde veriam amigos morrerem e as adversidades crescerem.
Mesmo que não fosse protagonista de muitas das histórias que trouxe do front, João acabou sendo a ligação com o dia a dia do campo de batalha. Esta é a imagem que os filhos fizeram dele. Particularmente para Manuel, tornou-se marcante o relato do pai sobre os nove pracinhas que faziam patrulha em dado cemitério na Itália e decidiram repousar no local após o trabalho, com a autorização de seu comandante. O que eles não esperavam é que os alemães estivessem escondidos ali, dentro de trincheiras. No final das contas, apenas dois brasileiros sobreviveram para relatar o acontecido.
Na medida em que narra esses fatos, Manuel deixa transparecer a importância de cada um deles na constituição da identidade de seu pai, a quem trata como um herói. Pela perseverança que manteve ao longo da vida, ou simplesmente por tudo que viveu, ensinou e aprendeu nos anos que se seguiram a sua experiência na Segunda Guerra Mundial. Com lágrimas nos olhos, Manuel evidencia o orgulho pelo pai. E também a dor pela ausência do homem que, mesmo após sua morte, aos 88 anos de idade, segue vivo na memória da família Mineto.
Segundo Manuel, sua maior realização foi conseguir levar o pai e a mãe, também irmã de um pracinha, à Itália pela segunda vez. Desta vez, sem ameaças, destruição ou mortes, mas com o simples propósito de refazer os caminhos que mudaram a vida de João Mineto. Revisitando memórias que, mesmo dolorosas, lhe proporcionaram um importante reencontro com o passado. Mais uma vez, a viagem marcou as vidas de pai e filho.
Galeria de João Mineto
Crédito: Acervo pessoal João Mineto

JACK DIAS PIRES
Procurando aventura, adolescente entrou na maior guerra da história
Em meados da década de 1940, aos 18 anos, o estudante José Jack Dias Pires resolveu se alistar como voluntário da Força Expedicionária Brasileira, deixando os pais preocupados com a "loucura" do primogênito. Como ele mesmo relatou anos depois, a atitude era reflexo de sua juventude. Ele se apresentou para a guerra "como uma criança que busca aventura". Com esse espírito, partiu para o Rio de Janeiro para treinar com os demais companheiros do Exército Brasileiro.
Pouco depois, o irmão Luciano Dias Pires acompanhou o susto e o sofrimento da mãe, Lázara, quando recebeu uma carta escrita pela namorada de Jack na qual contava sobre a partida para a guerra. A única forma de se comunicar com o filho era por meio das cartas que, muitas vezes, chegavam rasgadas após passarem pela censura imposta pelo Exército, com objetivo de evitar que os soldados se sentissem desestabilizados ou que as tropas fossem localizadas por inimigos.
A vida de Jack esteve por um fio em muitos momentos. Os aviões alemães, que sobrevoavam destruindo tudo o que encontravam, foram os principais responsáveis pelos riscos sofridos por ele. Em Pistóia, Jack jantava com outros pracinhas quando barulhos ensurdecedores de bombas assustaram a tropa. Depois de segundos paralisados, correram até um galpão de refugiados. Jack se apoiou na parede e sentiu sua mão escorrer por um líquido pastoso. Ao acender a lanterna, percebeu que havia sangue e, ao lado de seus pés, um corpo esquartejado. A história foi narrada em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo em maio de 1968. O irmão Luciano também lembra outras histórias contadas por Jack, como o cenário da morte de Benito Mussolini e outros ataques aéreos alemães que quase lhe custaram a vida.
Também na Itália, Jack teve o primeiro contato com algo que se tornaria parte essencial para os próximos anos de sua vida. Uma câmera comprada em Piza foi o ponto inicial para o jovem amadurecer o gosto pela fotografia, que se tornaria sua profissão. Após o retorno a Bauru e o encontro emocionado com a família, Jack encontrou dificuldades e começou a trabalhar em uma lanchonete. Anos depois, partiu para São Paulo e seguiu como fotógrafo do jornal O Estado de São Paulo.
Galeria de José Jack Dias Pires

Após a guerra, Jack se tornou fotógrafo do Estadão. Em 1968, o jornal publicou uma matéria sobre a história dele nos campos de batalha.
Crédito: Arquivo Estadão
Crédito: Arquivo pessoal Luciano Dias Pires
Curiosidades
Roteiro da FEB na Itália
No dia 15 de setembro de 1944, a FEB assume sua posição na frente de batalha perto da foz do Rio Serchio, na Toscana. A primeira cidade conquistada é Massarosa. Na sequência, os brasileiros tomam Camaiore e Monte Prano.
No final de setembro, os brasileiros conquistam a localidade. O avanço vai até Barga (11 de outubro) e a região de Sommocolonia (dias 29 e 30), onde surpreendem o inimigo, que contra-ataca no dia seguinte e reconquista parte do território.
No mês de novembro, a tropa vai para Porreta Terme, nos Apeninos, se posicionando frente às fortificações alemãs da Linha Gótica (uma das últimas grandes defesas realizadas pelas forças nazistas, com o intuito de bloquear o avanço dos aliados na Itália), que ficava no caminho até Bolonha. Entre dezembro de 1944 e fevereiro de 1945, são feitos 5 ataques a Monte Castelo. No dia 21 de fevereiro, ele é conquistado. No mês seguinte é a vez de Castelnuovo.
No dia 14 de abril de 1945, a FEB toma Montese no mais sangrento combate enfrentado pela tropa na Itália. Os alemães contra-atacam sem sucesso.
No dia 22 de abril, a FEB usa os caminhões de artilharia para transportar sua infantaria, que perseguia os alemães que iniciavam sua retirada. Foi travada uma luta em Zocca.
A FEB combate em Collecchio e ruma em direção a Fornovo di Taro para interromper a retirada inimiga, que vinha de La Spezia. Cercados, 14 mil soldados alemães se rendem entre 29 e 30 de maio.
No dia 2 de junho, as tropas brasileiras entram em Turim e chegam à cidade de Susa, a 3 Km da fronteira francesa, onde faz contato com o exército daquele país. É o fim da guerra na Itália.
Pracinhas criaram músicas baseadas nas vivências da guerra
No período em que defenderam a Força Expedicionária Brasileira, os soldados brasileiros vivenciaram muitas histórias. Algumas delas estão interpretadas em músicas compostas pelos próprios pracinhas enquanto descansavam na retaguarda. As letras tratam de diversos temas, como a saudade da terra natal, os desafios impostos pelos alemães e até mesmo algumas piadas com as situações que enfrentavam.
Algumas dessas músicas foram gravadas pelo correspondente de guerra da BBC (emissora pública de rádio e televisão do Reino Unido) Francis Haloweel, chamado pelos brasileiros de “o Chico da BBC”. As gravações ocorreram no show “Só pena que voa”, realizado no Clube dos Praças da FEB pouco depois do término da guerra, enquanto a tropa aguardava o embarque para o Brasil. Confira algumas das mais conhecidas:
Autor: José Pereira dos Santos
“Portare via” significa “esconder-se, emboscar-se” em italiano. Já “andare via” é o mesmo que “ir embora”. A letra mostra que o pracinha brasileiro era avisado pelo povo italiano da presença dos alemães que se retiravam do local após o avanço da FEB.
Compositor: Malagueta
A música faz referência à vitória dos brasileiros sobre os alemães e ao lema da FEB. A autoria é incerta, sendo creditada a um integrante da FEB apelidado de “Malagueta”.
Compositor: Natalino Cândido da Silva
A música mostra a bravura dos brasileiros. Depois de quase um ano no front, os pracinhas incorporam palavras e expressões italianas a seu vocabulário cotidiano, como “tedesco” (alemão), “paura” (medo) e “andare via” (sair).
Compositor: Natalino Cândido da Silva
A composição do soldado Natalino Cândido da Silva conta, com bom humor, como os pracinhas conseguiram escapar das metralhadoras dos alemães (os tedescos). Na música, elas são chamadas de “lurdinhas”, forma como os brasileiros apelidaram essas armas após um soldado brincar que a velocidade delas era superior a da sua esposa (cujo nome era Lurdes) quando começava a falar.
Compositor: Pieri Junior
O soldado faz uma homenagem ao seu pelotão. O samba foi gravado pela BBC no acampamento do Regimento Sampaio, em Francolipi.
Compositor: 3º sgt. Roldão Alves Gutenberggento
A música faz referência à conquista de Monte Castelo. Segundo Francis Hallowel, o sargento Roldão compôs a música no início de março durante momento de parada na progressão das tropas brasileiras, dias depois da tomada do monte.
Walt Disney fez a cobra fumar
“É mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil entrar na guerra”. Essa frase era comumente ouvida no país no início da década de 1940. Mas a história foi outra. O presidente Getúlio Vargas declarou guerra ao Eixo, fazendo a cobra fumar na farda dos pracinhas brasileiros. O símbolo da cobra foi adotado pelos próprios soldados, que criaram o distintivo que seria incorporado aos uniformes.
Mas um outro personagem ilustre resolveu fazer uma releitura: o desenhista e produtor de animações Walt Disney. A partir do símbolo original, Disney decidiu fazer uma homenagem aos brasileiros. A versão desenhada pelo artista americano foi publicada na edição de 22 de fevereiro de 1945 de O Globo Expedicionário, tabloide distribuído para os pracinhas na Itália. A ideia era mostrar a força dos brasileiros por meio de uma cobra com atitude beligerante.
Navio desenvolvido pela marinha americana homenageou Bauru
Patrulhamento, detecção e caça aos submarinos do Eixo. Essa era a função do contratorpedeiro USS McAnn (DE-179), cuja inauguração ocorreu em 15 de setembro de 1943 em New Jersey. Pouco mais de um ano depois, em agosto de 1944, ele foi transferido por empréstimo à Marinha do Brasil (foi doado definitivamente em 1953), que o batizou de Contratorpedeiro-Escolta Bauru, em homenagem à cidade paulista.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o CE Bauru fez parte de uma esquadra que revolucionou os conceitos de guerra naval no Brasil. Até então, os navios que compunham a Marinha brasileira utilizavam tecnologia da Primeira Grande Guerra. Entre os principais ganhos da nova esquadra estavam o sonar (instrumento para localizar objetos nos oceanos, como submarinos) e a inclusão de armamentos de ataques a submarinos.
O CE Bauru participou de comboios e efetuou missões de apoio no transporte de tropas e patrulhamento em zonas de guerra, além de escoltar navios mercantes. Ele operou durante quarenta anos, tempo em que navegou 295.405 milhas em 1.423 dias de mar.
Terminada a guerra, foi incorporado à Flotilha de Contratorpedeiros. Posteriormente, em 1964, seu armamento foi removido e passou a fazer parte do Esquadrão de Avisos Oceânicos. Nesta esquadra, recebeu missões de apoio aos faróis, treinamento de novos marinheiros e patrulha dos rios da Amazônia.
Após sofrer reformas de adaptação, foi aberto à visitação pública no ano de 1982 como navio-museu, exercendo essa função até os dias de hoje. Com 14 ambientes, o museu está atracado no Espaço Cultural da Marinha no Rio de Janeiro. Na mostra, existem armamentos, instalações e outros detalhes que retratam a vida a bordo dos marinheiros brasileiros que lutaram na Segunda Guerra Mundial.
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Jornal carioca O Globo criou tabloide para os pracinhas brasileiros

Crédito: O Globo

Os pracinhas torciam para encontrar uma mensagem dos familiares e amigos nas páginas do jornal.

As notícias do futebol não poderiam faltar. A situação dos grandes clubes brasileiros também era pauta frequente do jornal.

Na edição do dia 22 de fevereiro de 1945, o tabloide trouxe uma gravura estilizada do lema da FEB ("A cobra está fumando"), elaborada e assinada por Walt Disney.

Walt Disney também participou de outras formas, como nas histórias em quadrinho do personagem Zé Carioca.

Os pracinhas se mantinham informados sobre os acontecimentos da guerra e também da política brasileira.

O Globo Expedicionário mostrava o apoio da população brasileira aos combatentes que foram para a Itália. Essa era uma forma de incentivar os soldados.

Os pracinhas se aglomeravam para ler o jornal. Uma das funções do tabloide era elevar o moral dos pracinhas com notícias sobre sua terra natal, além de trocar mensagens e cartas entre eles e seus familiares.
Edições do Jornal
1944
Clique sobre os Ícones para fazer o download.
1945
Clique sobre os Ícones para fazer o download.
As personalidades que participaram da FEB
A FEB foi composta por pessoas de diversas camadas sociais. Alguns de seus integrantes, inclusive, desempenhariam importantes papéis na vida política, social e cultural brasileira.
Clarice LispectorA escritora Clarice Lispector atuou como voluntária junto ao corpo de enfermeiras da FEB. Clarice foi à Itália acompanhando o então marido, Maury Gurgel Valente, diplomata no Ministério das Relações Exteriores, que foi enviado a Roma no período.
Humberto de Alencar CastelloO primeiro presidente a assumir o Brasil após o golpe militar de 1964, Humberto de Alencar Castello Branco foi chefe de Seção de Planejamento e Operações da FEB. Ele foi importante no planejamento e implementação de manobras militares nos combates na Itália.
Golbery do Couto e SilvaO capitão Golbery do Couto e Silva era integrante do Serviço de Inteligência do Exército. Após a guerra, foi chefe da Casa Civil entre 1974 e 1981. Entre suas publicações está o livro “Geopolítica do Brasil”.
Octavio CostaOctavio Costa foi tenente de informações do 11º Regimento Infantaria. Depois da guerra, dedicou-se à área de ensino do Exército. Anos depois, durante o Regime Militar, foi assessor de comunicação do presidente Emílio Garrastazu Medici.
Boris SchnaidermanNascido na Ucrânia, Boris Schnaiderman mudou-se para o Brasil aos oito anos de idade. O escritor, tradutor e ensaísta naturalizou-se brasileiro em 1941. Aos 27 anos, foi sargento da artilharia brasileira na Itália. A experiência de lutar com a FEB foi base para o romance “Guerra em Surdina: histórias do Brasil na Segunda Guerra Mundial”.
Celso FurtadoUm dos principais intelectuais brasileiros do século XX, Celso Furtado terminava o bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) quando foi convocado pela FEB, em 1944. Após a guerra, continuou os estudos, tornando-se um dos maiores economistas brasileiros da história. Foi diretor da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), criador da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), diretor do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES) e ministro do Planejamento no governo João Goulart.
PerácioJosé Perácio Berjun, mais conhecido como Perácio, foi jogador do Botafogo e do Flamengo durante as décadas de 1930 e 1940. O meio-campista também jogou pela Seleção Brasileira e participou da Copa do Mundo de 1938. Em 1944, lutou com a FEB na Itália. Após a Segunda Guerra Mundial, voltou a atuar pelo Flamengo.
GeninhoEfigênio de Freitas Bahiense, o Geninho, o mineiro chegou ao Rio de Janeiro para vestir a camisa do Botafogo em 1940. Ao desembarcar, imaginava que defender o clube seria sua grande missão. Quatro anos depois, porém, alistou-se para servir a FEB. Na volta, o jogador continuou no Botafogo.
Antônio Matogrosso PereiraO militar Antônio Matogrosso Pereira foi pai de cinco filhos, entre eles o cantor Ney Matogrosso. Antes de se tornar famoso, o filho também iniciou a carreira militar, atuando na Aeronáutica.
João Lavor Reis e SilvaJoão Lavor Reis e Silva era funcionário dos Correios quando foi convocado para integrar a FEB. O militar é pai do baterista João Barone, dos Paralamas do Sucesso. O filho, aliás, se tornou especialista no tema. Além de colecionar materiais da época (o que inclui medalhas, fardas e até mesmo um jipe), ele já lançou dois livros sobre o conflito: “1942: O Brasil e sua guerra quase desconhecida” e “A minha Segunda Guerra”.
PolyÂngelo Apolônio (utilizava o nome artístico Poli, também escrito como Poly) foi instrumentista e compositor. Poly era um dos principais nomes do rádio brasileiro nas décadas de 1930 e 1940. Ele interrompeu a carreira para integrar a FEB em 1944, ano em que gravou seu primeiro disco solo. Com o fim da guerra, retomou a carreira.


Memória Viva
Em busca da história
Portal FEB: http://www.portalfeb.com.br/
Associação Nacional dos Veteranos da FEB: http://www.anvfeb.com.br/
Museu Virtual da FEB: http://museuvirtualfeb.blogspot.com.br/
Sentando a Pua: http://www.sentandoapua.com.br/portal/
O Lapa Azul - Os Homens do III Batalhão do 11º RI na II Guerra Mundial
http://www.youtube.com/watch?v=oqUQERwnxsk
Ano: 2007. Duração: 60 min | Direção: Durval Jr. | Roteiro: Adriana Rezende
A cobra fumou
http://www.youtube.com/watch?v=-is_cC-gjxI
Ano: 2002. Duração: 1h34 | Direção e roteiro: Vinicius Reis.
O Brasil na Guerra - Especial da Revista Veja
http://veja.abril.com.br/especiais_online/segunda_guerra/edicaoespecial/indice.shtml
O Brasil em Armas - Especial do Estadão
http://topicos.estadao.com.br/o-brasil-em-armas
O Brasil na Segunda Guerra - UOL Educação
http://educacao.uol.com.br/busca-disciplinas/?b=Brasil%20na%20Segunda%20Guerra
Jogo “A cobra vai fumar”, desenvolvido pelo site da Revista Superinteressante
http://super.abril.com.br/multimidia/info_510704.shtml
Extensão para o famoso jogo “Battlefield” com as principais batalhas dos pracinhas brasileiros
http://marciocunh.wix.com/mod-feb